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Por Guilherme Maggesissi
Introdução:
Pelo próprio título desse trabalho
já observamos uma complexidade e uma incongruência na articulação entre os dois
fenômenos que serão estudados e, que estão apresentados no título de tal
estudo. Porém, tal trabalho pretende analisar a importante relação que esses
dois elementos tiveram demonstrando que um desses elementos, contribuiu como um
forte fator para que houvesse o surgimento e a manutenção do outro.
Logo,
para isso, teremos que romper com todos os pressupostos que temos a respeito
sobre o que nos é mostrado e o que sabemos do movimento skinhead e iremos aprofundar nosso conhecimento sobre o início
de tal movimento estudando quais eram as primeiras vertentes ideológicas e
culturais que tal grupo mantinha em seu início, em 1969, e como a partir da década
de 70, este grupo foi adquirindo estruturas cada vez mais xenofóbicas e
racistas.
Com
isso, no primeiro capítulo iremos estudar o surgimento do movimento skinhead,
quais eram suas ideologias e seus hábitos culturais e quem eram as pessoas que
faziam parte desse grupo. No segundo capítulo, irei falar sobre as raízes
jamaicanas passando de colônia da Inglaterra para um país independente em 1963,
e farei um paralelo com outro fenômeno que estava surgindo em tal país crescendo
junto com a euforia da independência, que é o surgimento do estilo musical
denominado ska.
O movimento Skinhead
No
início do filme Skinhead attitude[1],
o vocalista da banda de Ska “Bad Manners”, Buster Bloodvessel, diz que um
verdadeiro skinhead, deve “amar seus Doctor Martens, amar a música ska, ter a
atitude correta em seu coração e na cabeça, tem que gostar de futebol... e o
mais importante, que é ser antirracista”. Podemos perceber nesse discurso, de
um homem que é um dos precursores do movimento skinhead na Inglaterra, uma
afirmativa que vai totalmente contra todo o estereótipo colocado nesse grupo
urbano, que há muito tempo tem sido taxado estritamente de neonazista pela
grande mídia e até por produções cinematográficas. Porém, como surgiu o
movimento skinhead e por que eles foram taxados como sinônimos de caos urbano e
ascensão neonazista na Europa e no mundo? É o que iremos estudar nesse
capítulo.
O início
O
movimento skinhead surgiu na Inglaterra no ano de 1969 oriundo de um outro
grupo de jovens que se denominavam “Mods” (abreviação de modernists). Esses
Mods eram rapazes que gostavam de andar de lambreta, usar cabelo curto, escutar
música negra (Soul, Ska, Rhythm and Blues) e brigar com os Rockers, entre
outras gangues. Já no final dos anos 60, tal grupo havia se dispersado ficando
de um lado, grupos de rapazes mais intelectualizados, culminando em bandas como
Pink Floyd e The Who e do outro, jovens que usavam a cabeça mais raspada e eram
mais agressivos que foram logo chamados de hard mods.
Outro
fator que ocorreu na Inglaterra durante a década de 60, é que com a
independência da Jamaica (1962) e a crise estabelecida em tal país, vários
jovens migram para a Inglaterra em busca de emprego e uma melhor condição de vida.
Esses jovens oriundos da Jamaica (Muitos deles fazendo parte de gangues
denominadas rudy boys), começaram a frequentar os mesmos bailes de ska e reggae
que os mods e logo, houve uma compatibilidade entre esses dois grupos que se
juntavam para dançar ao som do ska, beber e frequentar os estádios de futebol. No final dos anos 60 essas brigas
protagonizadas pelos hard mods nos estádios de futebol criaram grande
repercussão na imprensa que os apelidaram de skinheads nome no qual eles são
reconhecidos até hoje.
Porém,
o que podemos perceber a respeito desse início do movimento skinhead, é que ele
além de sofrer grande influência da cultura musical negra, oriunda
principalmente da Jamaica, é que também, muitos skinheads eram negros e andavam
junto com os brancos curtindo o mesmo som, e indo as mesmas festas. Com isso,
um fator principal no qual hoje esse grupo é lembrado nos tempos atuais (como
um grupo totalmente formado por neonazistas), era algo fora de questão no
início de tal movimento, e era o fator antirracista, que prevalecia em tal
grupo, nos tempos lembrados por muitos skinheads tradicionais como o ápice do
movimento, que se remete ao ano de 1969.
Década de 70, o punk e
o Nacional Front
Na
década de 70, há o surgimento do movimento punk, que faz com que muitos jovens
dentre eles, jovens skinheads, aderissem ao novo movimento. Contudo,
influenciados por bandas como Sham 69, U.K. Subs entre outras, há surgimento do
termo designado como “Punk Oi” que foi massivamente aceito pelo grupo de
skinheads, fazendo deste, um novo estilo agregado por esse grupo.
Outro
fator que desarticulou a estrutura do movimento skinhead durante a década de
70, foi o surgimento de um partido de extrema direita, denominado National
Front, tal partido implantou ideias xenofóbicas e racistas em muitos jovens na
Inglaterra durante tal época, agregando a ele também, jovens skinheads. Logo,
ocorre uma generalização feita através dos grupos midiáticos, onde afirmava que
todos os skinheads eram nazistas, apesar de haver nessa época, inúmeras bandas
de reggae, de skinhead reggae e de vertentes que vinham pregando o não
preconceito; essa vertente ficou conhecida como “2 Tone” e estava vigente e
vigorando no movimento skinhead da época.
Assim,
o movimento que antes era majoritariamente sem nenhuma intenção racista e que
absorveu forte influência da cultura negra e da cultura jamaicana, foi corrompida em parte, por partidos políticos de
extrema direita que trouxeram para sua causa alguns jovens skinheads, onde a
imprensa, fez o resto do trabalho generalizante, atribuindo a todos os
participantes do movimento, como sendo adeptos à ideologia Nazi-fascista. Hoje em dia, o
movimento skinhead é dividido em várias vertentes, porém, não podemos esquecer
a importante influência que a cultura negra representou e ainda representa em
tal movimento.
Acervo Pessoal |
Jamaica: Colonização e
independência
A
Jamaica é um país localizado na América central, colonizado desde o século XVII
(1670), pela Inglaterra. Tal colônia, teve como principal atividade ao longo da
colonização inglesa, o cultivo de cana-de-açúcar, onde para incentivar e para
aumentar a produtividade de tal atividade, a Inglaterra promoveu um crescente
fluxo de escravos para trabalharem nesse setor em tal região.
Segundo
Richard Price em seu artigo Reinventando
a história dos quilombos: Rasuras e confabulações[2],
a Jamaica e no Suriname são os países onde existem as maiores populações
remanescentes de quilombos. Essa informação, nos mostra o grande número de
populações negras residentes no território jamaicano, que vieram trazidas para
trabalharem no cultivo de cana-de-açúcar. Logo, a partir do século XIX a
população negra jamaicana superou em número a população branca habitada em tal
local, e em conjunto com o crescimento populacional da população negra, há
também um aumento do número de reivindicações e de revoltas de tal grupo por
melhorias em suas condições de vida, liberdade e fim da escravidão.
Ska e independência
jamaicana
Reúnam-se
, irmãos e irmãs. Nós somos
independentes , somos independentes. Junte-se as mãos, as crianças começaram a dançar. Nós
somos independentes , somos independentes...[3]
Em
5 de agosto de 1962 a Jamaica obteve sua independência da coroa Britânica. O
clima de euforia se espalha pelo país, surgindo uma maior valorização para a
cultura e para o nacionalismo jamaicano. Dessa nova demanda cultural, o ska
passa a ganhar maior notoriedade nas ruas e nos bailes jamaicanos, tal estilo
musical surgido nos fins dos anos 50 passa a se tornar o som sinônimo do que é
ser jamaicano a partir do momento que tal país conquista sua independência e
passa a valorizar hábitos e elementos culturais oriundos de seu próprio país.
O
ska que é um estilo musical derivado do R&B (Rhythm and Blues), de elementos
africanos, de influência do Soul e da música negra dos Estados Unidos, e também
de estilos musicais derivados das ilhas caribenhas, que acaba pegando tais
influências e adquirindo características próprias, tornando-se o primeiro som
legitimamente jamaicano.
Assim,
o processo de independência se juntou com o agitado ritmo que era o ska,
acarretando na euforia do momento e contribuindo para a ascensão de tal ritmo
na Jamaica, logo inúmeras bandas surgiram mostrando seu trabalho. O ska passa a
ser reconhecido por todo o mundo ganhando adeptos até na Inglaterra, onde
grupos de Mods se juntavam para agitarem ao som desse novo estilo.
Outro
processo que o ska desencadeou, foi o surgimento de um grupo de delinquentes
juvenis jamaicanos que eram chamados de “Rudy Boys”, esses grupos de rapazes se
reuniam para brigar e para curtir o ska nos bailes jamaicanos. Logo, com um
processo de crise que irá se implantar na Jamaica, tais delinquentes irão
migrar para a Inglaterra em busca de melhor condições de vida e lá, encontraram
com grupos de hard mods, grupo no qual eles irão ver que tem muito em comum.
Rudy Boys. Fonte: Acervo Pessoal |
Conclusão
Logo,
a partir do estudo sobre o surgimento do movimento skinhead e também, a partir
de um estudo sobre a história jamaicana, percebemos que o processo cultural e o
surgimento de tal grupo (os skinheads), visto hoje pela grande maioria como
neonazista, não está ligado estritamente a história da Inglaterra, e que também
não está ligado somente a história da Jamaica; tal grupo está ligado também a
todo um processo histórico que vem desde o momento em que os negros vieram pra
Jamaica para trabalharem no cultivo de cana-de-açúcar. É no navio negreiro que
chega toda população ascendente que irá desencadear um processo contestante e
cultural proporcionando o surgimento do ska, o processo de independência
jamaicana, e a própria cultura jamaicana que irá se espalhar pelo mundo.
É da cultura negra que surgirá
elementos fundamentais para o surgimento de tal estilo musical e de todos os
seus derivados. Com isso, tais fatores que parecem tão longe um do outro, que é
o movimento skinhead e o navio negreiro, estão ligados por um traço histórico,
e reduzir tal movimento a um fenômeno estritamente ligado ao nazi-fascismo é
algo de extrema ignorância sobre o assunto. Logo, os traços históricos que unem
o movimento skinhead e toda a cultura e a história oriundas do navio negreiro,
não serão apagados enquanto houver estudiosos curiosos em saber mais sobre as
origens de determinado assunto e, um compromisso com a verdadeira história.
Acervo Pessoal |
Referência bibliográficas
MARSHALL,
George. Espírito de 69: A bíblia
skinhead. Inglaterra: Trama, 1993.
PRICE, Richard. Reinventando a história dos quilombos: Rasuras e confabulações.
Disponível em: http://www.afroasia.ufba.br/pdf/afroasia_n23_p241.pdf.
Acesso em: 16/02/2014, 15:33:30.
VASCONCELOS, Wilson Santos de. Skinheads: O movimento e suas
dissidências. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/43926406/Skinheads-o-movimento-e-suas-dissidencias.
Acesso em: 16/02/2014, 18:09.
Referência Conematográfica:
SKINHEAD
Attitude. Produção de Werner Schweizer. Produtora: Valentin
Greutert. Suíça, França e Inglaterra: ,
2003. 1 videocassete.
LA HISTÓRIA del reggae. Produção: BBC.
Londres. 2002. 1 videocassete.
[1] SKINHEAD Attitude. Produção de Werner
Schweizer. Produtora: Valentin Greutert. Suíça, França e Inglaterra: , 2003. 1 videocassete
[2]
PRICE, Richard. Reinventando a história
dos quilombos: Rasuras e confabulações. Disponível em: http://www.afroasia.ufba.br/pdf/afroasia_n23_p241.pdf.
Acesso em: 16/02/2014, 15:33:30.
[3] Derrick Morgan. Música: Forward march. 1962
Gostei muito do texto. Fico agradecido por ter sido referenciado. Abraços!
ResponderExcluirobrigado, seu trabalho foi de extrema importância para o desenvolvimento de tal trabalho, pois tal assunto é pouco utilizado no meio acadêmico!
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