"As Vésperas do Leviathan" de António Manuel Hespanha, publicado no ano de 1994. |
Por Vanir Junior:
O ponto principal deste texto é que
Hespanha nos leva a uma problematização de contestação à ideia tradicional de
absolutismo e formação do Estado Moderno. Este autor propõe a existência de uma
pluralidade de centros de poder político e critica a ideia de total
centralização. Pensar o Estado Moderno por esta ótica, segundo Hespanha, é um
equívoco, pois, para ele, o controle político era difuso, não emanando apenas
de um único centro.
Para Hespanha, a noção de centralização e
absolutismo é uma abstração, pois, em sua visão, na prática, tais aspectos não
se verificaram antes do século XVIII, já que, para isso, havia necessidade de
um aparelho de poder altamente centralizado, que, segundo o autor, ainda não
existia no século XVI.
Com relação à sua pesquisa, que é
referente a Portugal, Hespanha só verifica a formação de um aparelho de poder
consideravelmente centralizado ou absoluto na época pombalina, ou seja, no
século XVIII. Deste modo, nas vésperas disso, ou seja, nas vésperas do Leviathan (alegoria
de Thomas Hobbes, o monstro para remeter a formação do Estado Absolutista), que
remontam os séculos XVI e XVII, para Hespanha, não existia absolutismo.
Seu instrumental teórico-metodológico de
análise se dá com base nos estudos do sistema de poder em Portugal para ver
empiricamente como funcionava o poder na época moderna. Autor utiliza como
conceito metodológico a ideia restritiva de poder político, por meio de uma
contenção temática e critica a historiografia que empalideceu o aspecto de
poderes políticos periféricos em Portugal. Neste sentido, o autor menciona
outros autores como Eduardo d’Oliveira França e Paulo Merêa, que, em suas
obras, apesar de trazerem novidades, como a identificação de instâncias de
poder de cunho mais local, como os concelhos, acabaram não trazendo inovações
ao entendimento do que tenha sido a centralização do poder em Portugal. Ambos
acabaram focando no absolutismo ou centralização como total aniquilação dos
poderes locais/regionais de cortes, concelhos e poderes
nobiliárquicos/senhoriais de forma geral.
Desta forma, o autor questiona uma
completa mudança da época medieval para a moderna e foca nas permanências da
primeira. Nega que o poder tenha sido emanado todo do Estado. Chama este ultimo
aspecto de “paradigma estadualista” e critica isto. Tal paradigma marcou a
historiografia do XIX, que tendeu a ser de caráter predominantemente liberal.
Neste sentido, os historiadores adeptos desta corrente olharam para o Antigo
Regime de maneira contrária: viram no mesmo a existência de um Estado totalmente
autoritário e extremamente centralizado. Esta foi uma visão exagerada. Era como
se todos os poderes emanassem apenas de um centro.
Outra face interpretativa deste “paradigma
estadualista” é que o século XIX é também o momento da formação dos Estados nacionais
e a historiografia deste período se volta justamente para a consolidação de
tais Estados. Acabou-se estabelecendo uma busca no passado dos Estados
Modernos, de maneira a estabelecer uma linha direta (nos moldes de uma
historiografia positivista) entre os mesmos e os Estados do XIX. Hespanha
chamou isto de “linha retrospectiva”.
De um modo mais geral, mudanças se deram
no campo da historiografia com a obra de Otto Brunner, que salientou
continuidades entre os sistemas medieval e moderno, como o senhorialismo e o
patriarcalismo.
Indo para o campo da História
Social de nomes com Pierre Chaunu, há a denúncia por parte do mesmo da
extraordinária fragilidade dos aparelhos de Estado. Na França, apenas 0,4% era
o corpo social a serviço do Estado Monárquico. Somente com o reforço de
centralização feito pelo Cardeal de Richelieu e, posteriormente, por Mazarino é
que o Estado se torna mais poderoso politicamente.
Assim, aprofundando a linha teórica
iniciada pelos nomes citados (Brunner, Oestreich e Chaunu), Hespanha propõe uma
renovação historiográfica, a partir do caso do Estado Moderno Português, para
refutar o paradigma estadualista tão presente na historiografia tradicional (de
nomes como Merêa e Oliveira França, mencionados no início deste texto). Deste
modo, o autor visa evidenciar as várias relações entre poder central e poderes
periféricos, bem como a pluralidade e os vários níveis e registros
institucionais locais de poder que faziam parte da lógica de funcionamento do
Estado Moderno.
HESPANHA, António Manuel. As Vésperas do Leviathan: Instituições e Poder Político - Portugal - Séc. XVII. São Paulo: Alamedina, 1994, p.p. 21-41.
Site da Imagem: http://www.fnac.pt/As-Vesperas-do-Leviathan-Antonio-Manuel-Hespanha/a185982
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